sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Pátria


Por um país de pedra e vento duro
Por um país de luz perfeita e clara
Pelo negro da terra e pelo branco do muro

Pelos rostos de silêncio e de paciência
Que a miséria longamente desenhou
Rente aos ossos com toda a exactidão
Do longo relatório irrecusável

E pelos rostos iguais ao sol e ao vento
E pela limpidez das tão amadas
Palavras sempre ditas com paixão
Pela cor e pelo peso das palavras
Pelo concreto silêncio limpo das palavras
Donde se erguem as coisas nomeadas
Pela nudez das palavras deslumbradas

- Pedra rio vento casa
Pranto dia canto alento
Espaço raiz e água
Ó minha pátria e meu centro

Me dói a lua me soluça o mar
E o exílio se inscreve em pleno tempo

segunda-feira, 9 de julho de 2012

In the middle of the road there was a stone

In the middle of the road there was a stone
there was a stone in the middle of the road 
there was a stone 
in the middle of the road there was a stone. 


Never should I forget this event 
in the life of my fatigued retinas. 
Never should I forget that in the middle of the road 
there was a stone 
there was a stone in the middle of the road 
in the middle of the road there was a stone. 


Carlos Drummond de Andrade 
traduzido por 
Elizabeth Bishop 


 No meio do caminho tinha uma pedra 
 tinha uma pedra no meio do caminho 
 tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra 


 Nunca me esquecerei dêsse acontecimento 
 na vida de minhas retinas tão fatigadas. 
 Nunca me esquecerei que no meio do caminho 
 tinha uma pedra 
 tinha uma pedra no meio do caminho 
 no meio do caminho tinha uma pedra.


Carlos Drummond de Andrade 

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Y la ciudad ahora es como un plano

Y la ciudad ahora es como un plano
De mis humillaciones y fracasos;
Desde esta puerta he visto los ocasos
Y ante este mármol he aguardado en vano.

Aquí el incierto ayer y el hoy distinto
Me han deparado los comunes casos
De toda suerte humana, aquí mis pasos
Urden su incalculable laberinto.

Aquí la tarde cenicienta espera
El fruto que le debe la mañana;
Aquí mi sombra en la no menos vana

Sombra final se perderá, ligera.
No nos une el amor sino el espanto;
Será por eso que la quiero tanto.

Borges

quarta-feira, 28 de março de 2012

Quando eu morrer

Quando eu morrer
Vão lamentar minha ausência
Bagatela
Pra compensar o presente
Em que ninguém dá por ela.

 Millôr Fernandes

domingo, 4 de março de 2012

Profundamente

Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Estrondos de bombas luzes de Bengala
Vozes, cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.

No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam, errantes

Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras acesas?

— Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.
*
Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci

Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?

— Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.

Texto extraído do livro "Antologia Poética - Manuel Bandeira", Editora Nova Fronteira – Rio de Janeiro, 2001, pág. 81.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Alguns gostam de poesia

Alguns –
ou seja nem todos.
Nem mesmo a maioria de todos, mas a minoria.
Sem contar a escola onde é obrigatório
e os próprios poetas
seriam talvez uns dois em mil.

Gostam –
Mas também se gosta de canja de galinha,
gosta-se de galanteios e da cor azul,
gosta-se de um xale velho,
gosta-se de fazer o que se tem vontade
gosta-se de afagar um cão.

De poesia –
mas o que é isso, poesia.
Muita resposta vaga
já foi dada a essa pergunta.
Pois eu não sei e não sei e me agarro a isso
Como a uma tábua de salvação.


Wislawa Szymborska
Tradução de Regina Przybycien


Niektorzy lubia poezje


Niektorzy -
czyli nie wszyscy.
Nawet nie wiekszosc wszystkich ale mniejszosc.
Nie liczac szkol, gdzie sie musi,
i samych poetow,
bedzie tych osob chyba dwie na tysiac.


Lubia -
ale lubi sie takze rosol z makaronem,
lubi sie komplementy i kolor niebieski,
lubi sie stary szalik,
lubi sie stawiac na swoim,
lubi sie glaskach psa.


Poezje -
tylko co to takiego poezja.
Niejedna chwiejna odpowiedz
na to pytanie juz padla.
A ja nie wiem i nie wiem i trzymam sie tego
jak zbawiennej poreczy.


Wislawa Szymborska